13 outubro 2013

História: Preservação do patrimônio material inclui tombamento

Imbuída do dever de cuidar do patrimônio material do Estado, a Fundarpe está envolvida no processo de tombamento dos bens

Além do dever de cuidar de patrimônios materiais pernambucanos, a Fundarpe também está envolvida no processo de tombamento de bens culturais do Estado. Os patrimônios tombados pelo poder público estadual são considerados parte da herança comum da sociedade e, por isso, são protegidos legalmente. Eles não podem ser destruídos ou descaracterizados após o tombamento; devem, portanto, permanecer na sua forma original e autêntica. “O Estado, através da Fundarpe, tem o dever de realizar o tombamento de bens que contenham elementos históricos e de outra natureza, que resultem em importância para a preservação da memória do povo pernambucano e brasileiro”, explica o presidente da Fundarpe, Severino Pessoa.

Para que algum imóvel seja tombado, é preciso que se envie à Secretaria de Cultura do Estado uma proposta de tombamento, com descrição do bem, delimitação da área, nome do proprietário do bem e nome completo do proponente, que pode ser qualquer cidadão. Se a Secretaria de Cultura aceitar o pedido, ele é encaminhado para a Fundarpe, que fará um exame técnico do imóvel e concluirá se ele deve ou não ser tombado. O processo termina com a entrega da Resolução de Tombamento pelo Conselho Estadual de Cultura ao Governador do Estado, que pode ou não aprová-lo. Cumprindo este ritual legal, o bem é inscrito em um dos cinco Livros de Tombo, compilação dos bens culturais tombados de acordo com a natureza do patrimônio.

Recentemente, a fundação se viu envolvida na polêmica da demolição do edifício Caiçara pela construtora Rio Ave. O prédio – que teve o seu processo de tombamento rejeitado pelo órgão técnico da Fundarpe – foi reivindicado pela população como um dos últimos símbolos da arquitetura modernista na Avenida Boa Viagem e considerado elemento importante da memória da Zona Sul do Recife. “A arquitetura modernista está seriamente ameaçada no Recife, uma vez que ela não guarda traços de um passado histórico secular, mas, ainda assim, conta a história da cidade. O Plano de Preservação de Patrimônio Cultural foi criado para definirmos diretrizes de preservação que vão nortear a escolha dos patrimônios que devem ou não ser tombados. Ele vai impedir que fatos como esses se repitam”, explica o Secretário de Cultura, Fernando Duarte.

Até 2012, os bens tombados pelo Estado somaram 144, sendo 62 bens tombados por Decreto Estadual e 82 tombados pela União e pelo Estado simultaneamente. Ainda estão em processo de tombamento estadual 124 bens. Após o tombamento, os edifícios públicos continuam sob a responsabilidade do Estado e os particulares continuam pertencendo a seus proprietários. Neste último caso, os donos de propriedades tombadas são os primeiros que devem arcar com a reforma e manutenção do edifício, que não pode ser descaracterizado ou destruído.

A situação é problemática, porque, quando tombados, os imóveis passam por uma série de restrições. Não podem, por exemplo, ter as suas fachadas alteradas ou o nível do telhado modificado. Segundo a Secretaria de Cultura do Estado, as obras e serviços somente são admitidos quando visam a restauração ou conservação, e tais intervenções devem ser previamente aprovadas pela Fundarpe, nos casos de tombamentos em nível estadual.

Tantas restrições não são vistas com bons olhos por muitos proprietários de imóveis tombados, em níveis federal, estadual ou municipal. A arquiteta Roberta Borsoi, por exemplo, moradora de uma residência no Sítio Histórico de Olinda, região tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), acredita que as regras de tombamento – que são as mesmas independentemente no nível do tombamento – poderiam ser menos radicais.

“Diante da nossa realidade atual, essa rigidez não faz mais sentido. Nós fazemos a arquitetura do nosso tempo, que é diferente da que se fazia há 500 anos. Antigamente, não havia suíte, por exemplo. Hoje, queremos tê-la, porque faz parte da nossa realidade. Como colocar um banheiro no quarto se é proibido?”, questiona a arquiteta. As regras de tombamento são bem menos radicais em países como França e Itália. Em Paris, uma pirâmide de vidro existe exatamente no teto do clássico Museu do Louvre. Em Veneza, há diversas loja de departamento em casas milenares, que perdem as suas fachadas antigas para exibir vitrines. Na cidade, há lojas de marcas como Chanel, Louis Vuitton e Emporio Armani.

O resultado é que, ao contrário do que deveria ser, ter uma casa tombada não é motivo de orgulho para muitos moradores. “Vários proprietários torcem para que o imóvel não seja tombado, porque eles não querem arcar sozinhos com os ônus da preservação. Isso é muito complicado, o governo deveria criar mecanismos para que os donos tenham interesse nessa preservação”, diz Jacques Ribemboim, presidente da ONG Civitate, que cuida do casario residencial da Rua Velha, no bairro da Boa Vista, com o apoio do Funcultura.

O alto custo de manter uma casa tombada é confirmado pela arquiteta Roberta Borsoi. “Trocamos as telhas várias vezes, não podemos mudar a fachada e nem pintá-la com qualquer tinta. Gastamos muito dinheiro para mantê-la”, conta. Além disso, como não é permitido derrubar paredes e esquadrias, muitos moradores têm que combater constantemente a presença de cupins.

Segundo a legislação estadual de tombamento, caso algum proprietário de residência tombada não tenha condições financeiras para mantê-la, ele deve comunicar a necessidade das obras à Secretaria de Cultura, que providenciará a execução das reformas. No entanto, segundo o presidente da Fundarpe, “patrimônios privados só são reformados pelo Estado em casos excepcionais, em que o bem é tombado, serve aos interesses públicos e não é usado pelo seu proprietário com fins lucrativos”. A diretora de Preservação Cultural da Fundarpe alega nunca ter recebido pedido de ajuda do Estado por moradores de imóveis tombados, durante os sete anos que ocupa o cargo.

Apesar da importância do tombamento, a maior parte dos imóveis tombados não exibem placas que sinalizem o registro. “Esse é um dos assuntos que debatemos no Plano de Preservação de Patrimônio Cultural de Pernambuco fazer com que a população se aproprie do que é dela, através das indicações de placas”, diz a diretora Célia Campos.

Além do desafio de investir mais fortemente no patrimônio material do Estado, a Fundarpe tem, como missão, descobrir o que a sociedade deseja para si mesma. “A questão do pertencimento será o cerne do futuro da Fundarpe. Antes de reformar algum edifício importante de Cabrobó, por exemplo, será preciso perguntar à população qual é o lugar que merece ser preservado”, defende o arquiteto José Luiz Mota Menezes. Um casebre que conte a história da cidade, portanto, pode ser mais importante que uma igreja católica. Investir no material sem ser elitista, como nos anos 1970, será a principal missão. Desafiante, e nova, sem dúvidas.

Confira abaixo lista dos 62 bens tombados pelo Estado.

LISTA DE BENS TOMBADOS PELO ESTADO

Até 2012, o Estado tombou 62 imóveis por Decreto Estadual. O processo de tombamento, no País, tem o intuito de proteger bens importantes para a memória do povo brasileiro. Após o tombamento, o patrimônio não pode ser destruído ou descaracterizado. Devem permanecer, portanto, na sua forma original e autêntica.

Sertão do São Francisco

– Cabrobó
Igreja de Nossa Senhora da Conceição

– Petrolina
Conjunto arquitetônico, em estilo neo-renascentista, da Estação da Estrada de Ferro Leste Brasileiro
Igreja Matriz de Nossa Senhora Rainha dos Anjos, abrangendo seu respectivo entorno e a Praça do Centenário

Sertão do Araripe

– Exu
Ambientes de origem e memória de Luiz Gonzaga do Nascimento (Luiz Gonzaga) – O Rei do Baião

Sertão do Pajeú

– Triunfo
Cine Teatro Guarany

Sertão do Moxotó

– Arcoverde
Casa do Cardeal Arcoverde, antiga Fazenda Fundão

Agreste Meridional

– Pedra
Pedra, monumento natural, localizado no município de Pedra

Agreste Central

– Altinho
Capela de Nossa Senhora do Rosário

– Bezerros
Igreja de São José dos Bezerros

– Brejo da Madre de Deus
Casa de Câmara e Cadeia da cidade de Brejo da Madre de Deus
Parque Nilo Coelho de Esculturas Monumentais em pedra granítica

– Caruaru
Rádio Difusora de Caruaru

– Gravatá
Prédio onde funciona a Cadeia Pública de Gravatá
Trecho ferroviário compreendido entre Recife e Gravatá

– Pesqueira
Prédio em que funcionam a Câmara de Vereadores e o Tiro de Guerra da Cidade de Pesqueira

Mata Sul

– Palmares
Cine Teatro Apollo

– Tamandaré
Fortaleza de Santo Inácio de Tamandaré – Forte de Tamandaré

– Vitória de Santo Antão
Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos da Victória
Sítio Histórico do Monte das Tabocas

Mata Norte

– Goiana
Igreja de São Lourenço de Tejucupapo

– Paudalho
Ponte Itaíba

– Timbaúba
Cine-Teatro Recreios Benjamim
Região Metropolitana do Recife

– Cabo de Santo Agostinho
Antiga casa rural do ex-Governador Dr. José Rufino Bezerra Cavalcanti, com terreno respectivo medindo 16.990m², antiga usina José Rufino
Engenho Massangana
Sítio Histórico do Cabo de Santo Agostinho e Baia de Suape

– Camaragibe
Casa Grande e sua área circundante, e respectiva paisagem do antigo Engenho Camaragibe

– Igarassu
Sítio Histórico do Pasmado e da Igreja de Nossa Senhora da Boa Viagem

– Itamaracá
Casa do Conselheiro João Alfredo
Engenho Amparo

– Jaboatão dos Guararapes
Igreja de Nossa Senhora do Loreto

– Paulista
Casa Grande e Jardim do Coronel
Conjunto Arquitetônico de Nossa Senhora do Ó
Sítio Histórico de Nossa Senhora dos Prazeres de Maranguape

– Recife
Arquivo da antiga Casa de Detenção do Recife
Prédio da Antiga Escola de Medicina
Basílica de Nossa Senhora da Penha
Casa Grande do Engenho Barbalho
Casa nº 157 da Rua Benfica, no bairro da Madalena
Cemitério dos Ingleses
Cinema Glória
Cinema São Luiz
Conjunto Ambiental, Paisagístico e Histórico do Prata
Edifício da antiga refinaria que deu origem ao “Conjunto Fabril da Tacaruna”
Conjunto Urbano da Rua da Aurora
Escola Rural Alberto Torres
Casa nº 263 da Rua da União, Boa Vista, Recife, onde viveu o poeta Manuel Bandeira
Hospital Pedro II
Hospital Ulisses Pernambucano
Igreja de Santo Amaro das Salinas
Capela da Igreja dedicada a Nossa Senhora de Fátima - incluindo o estacionamento da capela e área diante da igreja
Liceu de Artes e Ofícios
Mural Pictórico de autoria do artista pernambucano Hélio Feijó
Palácio da Justiça de Pernambuco
Palácio do Campo das Princesas e todo perímetro da Praça da República
Pavilhão Luiz Nunes
Sítio Histórico da Igreja Matriz da Paróquia de Nossa Senhora da Boa Viagem, correspondendo à Igreja, ao Obelisco, à Praça de Boa Viagem e à Casa de nº 16, no bairro de Boa Viagem
Antiga Casa de Detenção do Recife, atual Casa da Cultura de Pernambuco
Torre Malakoff
Edifício localizado entre as ruas do Imperador, nº 463, e Martins de Barros, com mesmo número no bairro de Santo Antônio
Quartel do Derby
Terreiro Obá Ogunté
Torre de Atracação do Graff Zeppelin e sua área de proteção de 84.000 m², situado no antigo Campo do Jiquiá

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