No domingo (22), o Jornal Folha de Pernambuco finalizou uma série de reportagens chamada “Reconstrução”.
Durante um mês, foram realizadas viagens às quatro cidades mais atingidas no Estado de Pernambuco pelas enchentes de 2010 e 2011. Barreiros, Palmares e Água Preta, todas situadas na Zona da Mata Sul, fazem parte da Operação Reconstrução, coordenada pelo Governo do Estado. As três localidades já estão com casas em construção para que as famílias as quais residem em Áreas de Preservação Permanente (APPs) possam se mudar. Em Goiana, na Mata Norte, todavia, a situação é distinta, visto que ela somente foi afetada no ano passado. Portanto, a cidade-tema reportagem que finaliza a especial não se enquadra na operação. Novas construções de habitação já estão em estudo para a localidade. Também haverá monitoramento do nível dos rios que banham a cidade. A ideia é prever possíveis enchentes e agir com antecedência. Enquanto isso, os moradores deste município só podem esperar e torcer para que as ações sejam eficazes, de modo a evitar novos transtornos na cidade já calejada.
Diferente das três cidades da Mata Sul que foram mais atingidas pelas fortes chuvas, Goiana ainda não recebeu auxílios concretos do Governo do Estado. Cerca de 77 mil pessoas residem no município, que está situado a 65 quilômetros de Recife. No entanto, a parcela da população que sofreu, de fato, com as enchentes, é bem menor.
Em torno de 626 famílias foram afetadas no ano passado. Em 2010, a chuva não chegou a abalar, tanto, o local. As histórias dos moradores, por sua vez, não diferem, em grande intensidade, do que os habitantes das outras cidades relataram durante a produção desta série. O sentimento de angústia, tendo em vista a proximidade do inverno, é o que prevalece em todos os cidadãos. Porém, ninguém foi agraciado com novas casas ou indenizações, para que as famílias deixassem a área de risco e buscassem espaços mais seguros. Apenas o auxílio-moradia foi destinado a alguns indivíduos, além de recursos básicos que foram encaminhados à cidade, na época em que ela estava em situação de emergência.
“Logo após as chuvas, a gente ganhou colchão, cesta básica. Mas não tive direito ao auxílio-moradia. Também não me falaram se eu ia ganhar casa ou indenização. O que não entendo é o critério que eles utilizam para dizerem que vão dar a casa a algumas pessoas e não dar a outras. Todo mundo foi atingido”, asseverou a aposentada Josefa Simplício, 62. Contrariando a maioria dos depoimentos dos habitantes de Barreiros, Palmares e Água Preta, a aposentada, que reside há mais de 20 anos em Goiana, afirmou querer ganhar a casa em outro lugar. “Tenho medo de a chuva vir, de novo, e levar tudo embora outra vez”, confessou. De acordo com Josefa, logo após o período das cheias, funcionários do Governo compareceram à casa da moradora, localizada no bairro da Impoeira, e fizeram o cadastro dela. “Veio uma moça aqui e tirou umas fotos dizendo que isso era para o cadastro do auxílio-moradia. Mas ninguém deu mais notícia disso, até agora”, atestou.
Outra família que ainda sofre com a falta de recursos a da professora Sandra Luíza Borges, 43, residente na Vila Operária. “A gente perdeu mais em relação a estrutura da casa. O chão ficou todo fofo e não recebi um centavo para restaurar minha casa. Só cesta básica mesmo. Era bom que a gente ganhasse indenização, porque escolhia um lugar melhor e comprava uma casa nova”, comentou. Na comunidade Balde do Rio, a dona de casa Maria José da Silva, 55, também relatou a experiência de vida na cidade. Ela afirmou que já passou por cinco cheias. “Mas duas foram maiores: a de maio do ano passado e a de junho”, afirmou. “Tive que arrumar uma canoa e botar minha filha dentro dela, porque ela estava com nove meses de gravidez. Também perdi meu afilhado, que foi levado pela água. É algo que a gente nem consegue explicar direito”, disse.
Maria do Carmo Souza, 59, foi a única moradora que a reportagem da Folha encontrou que disse ser beneficiada com o auxílio-moradia. Residente do bairro do Cortume, ela enfrentou a chuva ao lado dos três netos. “Quase que eles foram embora na água. Lembro que o ‘menorzinho’ olhou para mim e disse: ‘vovó, a gente vai morrer aqui’.
Nessa hora, pedi para um rapaz levá-los lá para cima (no topo da ladeira) e eu ainda consegui suspender algumas coisas”, relembrou. Sobre ganhar uma nova casa, ela afirmou que não foi informada sobre esse direito.
“A gente tem é que esperar mesmo. Medo todo mundo tem. Mas vamos fazer o quê? Com o dinheiro do auxílio, não dá para alugar outra casa”, justificou.
Fonte: Folha de Pernambuco