24 outubro 2011

A segurança pública na sociedade contemporânea por Maxwel Aurélio

RESUMO: O presente artigo tem como objetivo indagar sobre as políticas públicas concernentes à segurança pública na sociedade contemporânea brasileira, mostrando conceitos e definições atinentes ao tema, alguns paradigmas influenciadores das condutas operacionais, assim como o atavismo com que se trata a questão da insegurança nas cidades brasileiras. Apresenta a filosofia de Polícia Comunitária como tendência moderna de administração dos recursos públicos, pois é mais acorde com o preconizado constitucionalmente, com o Estado Democrático de Direito, onde o cidadão deve ter voz e vez no processo de tomada de decisões e, a partir daí a implementação de soluções viáveis oriundas da participação popular.

INTRODUÇÃO
A convivência nas cidades trouxe consigo a necessidade do respeito aos direitos alheios, condição indispensável à harmonia social, sob pena da impossibilidade da mantença da vida em sociedade. Visto que desde Aristóteles, entendia-se a importância do homem pertencer a uma Polis, para o Filósofo o homem vivendo sozinho "ou é um Deus ou um bruto". Isto porque desde tempos imemoriais, o homem, ao contrário de outros animais, não possui qualquer adaptação fisiológica que o possa tornar um ser dominante no reino animal. Exceto por suas enormes: adaptabilidade, sociabilidade, inteligência, linguagem articulada e etc. Condições essas que aliadas ao trabalho em grupo, permite o domínio completo do planeta terreno.

A despeito destas vantagens da vivência coletiva, desde as Polis a sociedade humana viu-se permeada de desvios sociais que exigiam a tomada de posição frente à delinqüência dos seus cidadãos. Órgãos policiais e jurídicos foram encetados com o objetivo de punir os transgressores, aplicando-lhes penas rigorosas, as quais tinham o condão de reparar o dano causado, e principalmente impor o terror aos recalcitrantes da lei. Filosofia que ainda se pode constatar nas legislações atuais do Brasil, estas cada vez mais rígidas, como a dos crimes Hediondos (8072/90), depois a lei de combate ao crime organizado (9034/95) e em seguida a lei 9426/96, que criou tipos penais novos e agravou desproporcionalmente algumas penas, com as quais se pretende coibir a prática delitiva com a imposição de penas elevadas e recursos restritos.

Como se pode verificar, com a edição de leis mais rigorosas, que a sociedade brasileira encontra-se insegura. O legislador pátrio responde aos anseios por segurança, com penas severas, muitas em desacordo com os parâmetros constitucionais, mormente no que concerne à dignidade da pessoa humana. Desnudando o hiato existente entre o Legislador e a sociedade que o cerca. Afinal de contas, quem são esses delinqüentes que assombram os brasileiros? Como surgiram em nossas ruas? A legislação de antanho era fraca em impor o medo aos transgressores? O sistema de justiça criminal brasileiro cumpre sua tarefa de ressocializar o apenado? A questão mais séria: Como evitar que os nossos jovens entrem para a delinqüência?

Quando o legislador acena com leis extravagantes, ao sabor da mídia agressiva, especialmente quando alguém de seus quadros sofre as agruras do crime, demonstra uma clara falta de planejamento governamental. A atitude reativa expõe fraquezas decorrentes da imprevidência, do descaso com a coisa pública, em especial pela falta de ética em todos os setores da sociedade. A hipocrisia com que são tratadas as pessoas, a falta de oportunidade de evolução, dando a impressão de a sociedade brasileira está dividida em castas de privilegiados e excluídos do mercado de consumo, estes últimos servem de mulas aos potentados, sem quaisquer perspectivas de mudança de estrato social.

Dentro desse quadro alarmante o legislador pátrio parece cego guiando outros cegos, não consegue ver a solução, pois não vê o problema. A delinqüência tem solução viável, esta passa necessariamente pela reformulação da ética social, pela educação familiar e formal, pela criação de possibilidade de mobilidade social, além da reformulação da política criminal, quando aplicada deve ser dirigida no sentido de que o delinqüente não volte mais a transgredir e, que o policiamento seja voltado ao respeito aos direitos humanos na sua acepção própria, o policial engajado no serviço receba todas as condições de trabalho, promovendo o resgate social de populações carentes e desassistidas, enfim envidando o policiamento comunitário, tendente efetivar o processo civilizatório e a partir daí efetivar-se a segurança de que tanto clamam as cidades brasileiras.

1. SEGURANÇA E INSEGURANÇA PÚBLICA
Segundo Maslow a segurança é uma necessidade primária ou higiênica sem a qual o homem não sobrevive. Daí porque a colocou na base da pirâmide de necessidades. Depreende-se disso que a insegurança provoca desequilíbrios de toda ordem na qualidade de vida do homem moderno, especialmente os residentes nos grandes centros urbanos. Onde viceja a delinqüência, ocasionando um transtorno conhecido como Síndrome da violência urbana, segundo Valla é gerada pela divulgação maciça de crimes ocorridos nas grandes cidades e, por vezes, em cidades de porte médio, e que é transportada indistintamente para os pontos mais distantes do território nacional, os quais passam a viver, solidariamente, o mesmo clima de insegurança vivido pelos grandes centros. As vítimas do distúrbio sentem-se nas mesmas condições das vítimas do crime e demonstram a sensação de serem a qualquer momento atacadas nas mesmas condições.
No entendimento de Dantas a maioria das pessoas não percebe com clareza o problema do crime ou a chamada criminalidade de massa, em sua prevalência global, e que incide predominantemente sobre o patrimônio material sob a forma de freqüentes e pequenos delitos, caso dos furtos. Ao contrário, a maior parte da comunidade é constantemente exposta a informações sobre crimes problema. Entre eles figuram os homicídios, seqüestros, roubos e outros delitos, não tão freqüentes, mas de grande impacto social pela violência com que são perpetrados. Informações sobre crimes problema podem ser tendenciosamente disseminadas com diferentes motivações: entreter acerca do que é fora do comum, explorar a curiosidade pública sobre um grave problema social, ou mesmo angariar simpatia ou promover antagonismo político-eleitoral. Com isso o clima de insegurança tende a recrudescer em face da exposição constante na mídia, dando a entender que existe um delinqüente atrás de cada poste de iluminação pública pronto para fazer mais uma vítima, coisa que não é verdade.

Na inteligência de Plácido e Silva: Segurança: derivado de segurar exprime, gramaticalmente, a ação e efeito de tornar seguro, ou de assegurar e garantir alguma coisa. Assim, segurança indica o sentido de tornar a coisa livre de perigos, de incertezas. Tem o mesmo sentido de seguridade que é a qualidade, a condição de estar seguro, livre de perigos e riscos, de estar afastado de danos ou prejuízos eventuais. E Segurança Pública? É o afastamento, por meio de organizações próprias, de todo perigo ou de todo mal que possa afetar a ordem pública, em prejuízo da vida, da liberdade ou dos direitos de propriedade de cada cidadão. A segurança pública, assim, limita a liberdade individual, estabelecendo que a liberdade de cada cidadão, mesmo em fazer aquilo que a lei não lhe veda, não pode turbar a liberdade assegurada aos demais, ofendendo-a.

A segurança apresenta dois aspectos importantes ou duas formas de apresentar-se, de acordo com Valla, a segurança pode ser entendida como aquela situação, proporcionada ao indivíduo, consciente de que nenhum direito seu, atual ou em expectativa, lhe será negado, pela ausência de risco, isto é, pela segurança objetiva, pela crença do indivíduo na ausência de risco - segurança subjetiva. Entendemos que a ausência total de riscos é utópica, pois a insegurança está implícita à existência humana, sempre cercada de adversidades de toda ordem, sejam conhecidas e determináveis ou totalmente aleatórias e descontroladas, restando somente a segurança subjetiva, a crença na ausência do risco.
MOREIRA NETO citado por Valla expõe que a segurança pública é entendida como: Conjunto de processos políticos e jurídicos destinados a garantir a ordem pública na convivência de homens em sociedade. Está implícito no conceito: 1) o valor garantido - O QUÊ, no caso, a convivência pacífica; 2) o autor da garantia - QUEM, é o Estado, detendo o monopólio do uso da força; 3) o risco - CONTRA O QUÊ, como sendo o antivalor, isto é, a perturbação potencial ou efetiva da ordem pública; 4) a modalidade de poder como fator de garantia - COM O QUÊ, pelo exercício do poder de polícia em quatro modalidades ou fases: a ordem de polícia; o consentimento de polícia; a fiscalização de polícia e a sanção de polícia.

A segurança pública, como exposto abrange não somente encargos atinentes às polícias, mas de uma ação complexa por parte do poder Público e, modernamente do conjunto social atendido. Especialmente pela nova ordem constitucional, quando diz que a responsabilidade é de todos. Como exarado no artigo 144 da Constituição Federal de 1988. A comunidade assistida tem sua parcela de contribuição a dar, não mais como mero expectador das ações estatais ou solicitador de socorros públicos, mas como agente reformador da segurança pública, visto que os problemas comunitários, os déficits sociais, os fatores geradores da delinqüência estão permeados no seio da comunidade, há que se tratar do mal no seu nascedouro, criando-se para tanto programas governamentais voltados ao resgate social com a participação ativa da comunidade serventuária, fugir a esse imperativo é retrocesso e mantença de um modelo que se mostra claramente exaurido.

Para Dantas as políticas de gestão comunitária da segurança pública vão ao encontro de uma tendência, nesse sentido, surgida nos Estados Unidos da América (EUA) por volta da década de 1980, a partir dos estudos de Herman Goldstein, professor emérito da Universidade de Wisconsin, autor da obra clássica "Policiando Uma Sociedade Livre". Tais políticas têm como corolário a premissa de que a comunidade conhece seus problemas de segurança pública, melhor inclusive que a própria polícia... Assim, é preciso dar poder à comunidade, ou "empoderá-la", num anglicismo (derivado da expressão "empowerment") já de uso comum entre brasileiros. A comunidade passa a ser, assim, objeto e sujeito das ações de prevenção, o que conota a expressão "Segurança Comunitária".

A polícia comunitária, também conhecida como polícia interativa ou de proximidade, não é uma nova estética ou apresentação de policiamento, mas uma filosofia a ser empreendida pela polícia moderna, na inteligência de TROJANOWICZ E BUCQUEROUX, O policiamento comunitário é uma filosofia de policiamento personalizado de serviço completo, onde o mesmo policial patrulha e trabalha na mesma área numa base permanente, a partir de um local descentralizado, trabalhando numa parceria preventiva com os cidadãos para identificar e resolver os problemas. Foge, portanto, do procedimento reativo baseado no atendimento ocorrências sem a preocupação com as causas determinantes do delito, para uma atitude pró-ativa na qual as parcerias comunitárias determinam um conjunto de ações voltadas à resolução dos problemas sociais, agindo antecipadamente, faz a profilaxia delitiva em vez da repressão pelo uso da força e, por conseguinte a movimentação do assoberbado aparato judicial do Estado.

De acordo com TROJANOWICZ E BUCQUEROUX a filosofia do policiamento comunitário baseia-se na crença de que os desafios contemporâneos requerem que a polícia forneça um serviço de policiamento completo, preventivo e repressivo, envolvendo diretamente a comunidade como parceira no processo de identificação, prioridade e resolução de problemas, incluindo crimes, medo do crime, drogas ilícitas, desordens físicas e sociais e decadência do bairro. Um amplo engajamento do departamento implica em mudanças tanto nas políticas quanto nos procedimentos. Para tanto o gestor público não pode ser refratário às mudanças, deve entender que os desafios atuais exigem decisões arrojadas que permitam o surgimento da massa crítica capaz de efetuar a revolução na segurança pública, baseada na participação popular, mais acorde, portanto, com o preconizado pelo Estado Democrático de Direito que se pretende seja implantado no Brasil. 

2. CONCLUSÃO
A segurança pública no Brasil têm sofrido graves ataques por parte da delinqüência que se instalou nas suas grandes cidades, fruto de uma sociedade desigual e injusta que não oferece as condições de evolução aos jovens residentes em subúrbios infectos. Como demonstrado no Documentário Notícias de uma Guerra Particular, o poder público sofre de uma miopia incurável, pois oferece nas operações policiais, uma solução para o tráfico de entorpecentes ilegais nos morros cariocas. É sabido que a única forma de Estado que sobe o morro é a polícia, que por sua vez entende que os favelados são todos desprezíveis delinqüentes, se forem mortos, somar-se-ão a outros sem que ninguém tome alguma providência, são pobres e não possuem condições de acionar o aparelho estatal, que lhes dê alguma solução em face da brutalidade oficial.

Ficou também demonstrado que o contingente de jovens favelados oferece uma "tropa" à disposição dos traficantes, pois pertencer ao tráfico corresponde a Status entre aqueles que não possuem as mínimas condições de mobilidade social, mesmo que suas vidas forem abreviadas no decurso da guerra, terão motivo de orgulho por não se sujeitarem aos achaques de uma sociedade essencialmente hipócrita que lhes nega o direito de existir condignamente.

A segurança pública tem solução no atendimento das demandas sociais, há que se reverem os procedimentos estatais em relação às populações carentes, haja vista a necessidade de romper-se com a estrutura arcaica onde a polícia existe para garantia das elites dominantes em detrimentos da massa desvalida, a polícia deve ser aliada do povo e não seu inimigo. Portanto a gestão participativa, por meio da polícia comunitária, abre um leque de opções que o modelo tradicional impede em face do Ethos organizacional vigente, no qual se trabalha na mantença do status quo do Estado neoliberal e suas elites, em detrimento daqueles que em ultima análise sustentam a pirâmide social. É fundamental a melhoria da qualidade de vida das populações carente para que haja a melhoria da qualidade da segurança pública.

Fonte: Fórum Segurança


Maxwel Aurélio é soldado da Polícia Militar e possui os seguintes cursos: Formação de soldados (SDS-PE), Curso de Inteligência de Segurança Pública (CISP/SDS-PE), Curso Intensivo de Ações Táticas Itinerante (CIATI/SDS-PE), Método Giraldi (SDS-PE), Pistola Taser (SDS-PE), Prevenção ao Uso Indevido de Drogas (SENAD-UFSC), Formação de Formadores (SENASP), Busca e Apreensão (SENASP), Investigação Criminal I e II (SENASP), Polícia Comunitária (SENASP), Identificação Veicular (SENASP), Direitos Humanos (SENASP), Capacitação em Educação para o Trânsito (SENASP) e Local do Crime: Isolamento e Preservação (SENASP), e colunista do Blog do Anderson Pereira.
 
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